Bem-estar universal

A velha busca por conforto: local e modelo de um calçado primitivo (Fonte: Plos One, 2009)

Bem-estar Universal

Por Ricardo Hentschel

Conforme publicado pela revista científica PLoS ONE, foi descoberto o par de sapatos de couro mais antigo de que se tem notícia. O local em que foi encontrado o artefato fica na Armênia, próxima à fronteira com o Irã e a Turquia, em uma caverna seca e fria.

As condições estáveis da caverna permitiram a conservação dos calçados datados de 5,5 mil anos. Feitos a partir de uma peça única de couro, costurados com cadarços de fibra vegetal, os calçados também apresentavam resíduos de grama em seu interior, que poderiam ter servido para que as peças não perdessem seu formato ou para manter os pés aquecidos.

Com 24,5 centímetros de comprimento (equivalente ao tamanho 36 no Brasil), as peças podem ter sido usadas por mulheres ou mesmo homens, uma vez que se encaixam aos tamanhos dos pés dos Homo sapiens desta época. Outro detalhe interessante, segundo os cientistas, é que “há enormes semelhanças entre a técnica de manufatura dos sapatos encontrados na caverna na Armênia com outros usados por toda a Europa posteriormente, o que indica que esse tipo de calçado foi usado em regiões de climas e ambientes bem distintos”.

Um fato que o artigo não destaca é que esse calçado era de um modelo ecológico.

Recordei-me de um amigo chileno que conheci durante a faculdade, que veio ao Brasil fazer intercâmbio. Vendo algumas fotos que ele mostrava de sua terra natal, reparei que, em muitas, ele estava descalço, mesmo naquelas em que ele aparecia agasalhado. Estranhei o fato, não comentei na hora, mas não consegui conter a curiosidade:

– Carlo porque estas descalço em várias fotos?

– Decidí no llevar zapatos por un tiempo.

– E como foi?

– (após alguns segundos) Diferente.

Fiquei um pouco insatisfeito com a conclusão. Isso eu ja imaginava. Também imaginei que os pés dele deviam queimar com frio do inverno chileno..

– Tá mas, foi bom? Ruim? Alguma melhoria?

– Depende..

– .. bom, mas e agora? Tu voltaste a usar calçados…

– Si.

Outra informação interessante que eu consegui arrancar dele foi que as pessoas estranhavam o fato dele não usar sapatos, o que eu também estranharia.

Apesar de polêmico, o teste do Carlo foi válido, ao menos para mim. Acredito que ele queria saber não apenas como seria a vida sem calçados, mas também se existe um meio alternativo de vida, que gerasse menos poluição. Mesmo depois de colocar o hábito em teste, Carlo voltou a utilizar sapatos, seja pela aceitação perante os demais, seja pelo seu bem-estar.

O bem-estar é alvo perseguido pelos humanos desde muito tempo, como pudemos notar através dos artefatos deixados pelo caprichoso parente armênio e pela experiência do amigo chileno. No entanto, as “necessidades” mudam e a meta do bem-estar dos nossos pés também deve considerar a sustentabilidade na sua produção.

Como fazer? Continuar inovando, utilizar resíduos de linhas de produção e reutilizar são ótimas iniciativas. Se agregarmos estas melhorias à indústria calçadista, certamente, o nicho de consumidores conscientes estará mais propenso a comprar novos calçados.

Texto originalmente publicado em: www.aboutshoes.com.br